22 mai 2023

Ambidestria corporativa: conceitos para que membros de Conselhos de Administração iniciem as suas jornadas

22 mai 2023

A gestão das empresas tem sido, até hoje, influenciada pelos princípios de gestão criados na Segunda Revolução Industrial. Princípios baseados na produção em massa, que se alavancavam graças ao conceito de divisão de tarefas e ao uso da energia elétrica, implantados em 1870. Desde essa altura as regras de funcionamento das empresas (com normais ajustes) não sofreram grandes questionamentos nem alterações. Por dois séculos a gestão tem sido baseada na hierarquia de decisões e funções, com elevado foco na cadeia de valor e atenção máxima ao produto, numa clara visão construída “de dentro para fora”. Apesar das diferentes mudanças que o mundo tem vivido, nomeadamente no início do século XXI, as empresas têm resistido a alterar o seu modo de atuar e de pensar.

Nomeada em 2016 pelo World Economic Forum, a Quarta Revolução Industrial chegou para mudar tudo. Baseada no uso de sistemas físico-cibernéticos, dando início à era da indústria conectada e das fábricas inteligentes, esta nova realidade tem-se expandindo e alargado na sociedade e no mundo com a crescente influência da tecnologia e da conectividade. Este fenômeno tem alterado o comportamento dos consumidores e a dinâmica dos mercados. Empresas ditas tradicionais têm perdido terreno para novos entrantes, que têm vindo a alterar o modus operandi da gestão e as dinâmicas dos negócios. O movimento startups e o clube dos unicórnios não param de crescer. Em maio de 2022, já são mais de mil unicórnios em todo o mundo, de acordo com o CB Insights. A sua imensa maioria com uma visão claramente de “fora para dentro”, atacando dores que até então nem sequer eram percebidas por empresas estabelecidas. É quase como se assumíssemos que “não importa o que a sua empresa faz, em algum lugar do planeta tem alguém preparando uma bala de prata para ela”, nas palavras de Luis Rasquilha (CEO da Inova Business School).

A evolução tecnológica, a mudança no comportamento do consumidor, a turbulência política e a incerteza econômica dos últimos anos reafirmaram aos gestores a importância da adaptabilidade – a capacidade de se mover rapidamente em direção a novas oportunidades e se ajustar a mercados voláteis e evitar complacências, sem prejudicar o negócio atual. A capacidade de uma empresa de executar simultaneamente a estratégia de hoje enquanto desenvolve a de amanhã surge do contexto atual da mudança, e para ter sucesso a longo prazo precisa dominar a adaptabilidade e o alinhamento – atributos definidos e conhecidos como ambidestria.

O termo “ambidestria”, que significa originalmente a capacidade de ser igualmente habilidoso com ambas as partes do corpo (ambidestro tem origem no latim ambi, que significa ambos, e dext, que significa certo), aterrissou na gestão há menos de duas décadas. Mais especificamente em 2004, em dois papers, sendo um deles do MIT Sloan Management Review (Building Ambidexterity Into an Organization, 2004), que apresentaram o termo e, consequentemente, o dilema de cuidar do negócio e da estrutura atuais e, ao mesmo tempo, olhar para negócios emergentes e estruturas futuras.

Como manter o negócio rentável e saudável hoje e, ao mesmo tempo, prepará-lo para o futuro? Os desafios de curto prazo existem e precisam de muita energia, mas o futuro exigirá novas estratégias e ações que precisam ser pensadas e planejadas hoje, sob pena de sermos pegos de surpresa por um novo paradigma que não nos permita, a tempo, preparar a organização e fazer o movimento.

Duas formas de ambidestria

A visão tradicional da ambidestria organizacional gira em torno de uma separação estrutural de iniciativas e atividades (ambidestria estrutural). A noção de ambidestria contextual, que se manifesta em um nível individual, representa um processo complementar.

 

Processo de coaching de ambidestria

Três stakeholders, no fim do dia, têm a responsabilidade maior de garantir o que chamamos de ambidestria corporativa – a gestão, a propriedade e o conselho. Nem sempre estas três entidades estão alinhadas neste sentido. Às vezes até estão alinhadas com relação à importância, mas não ao timming em que os movimentos precisam ser feitos. Conflitos de agenda são inevitáveis quando nem todos têm a convicção de que a ambidestria é necessária. O elo entre os interesses destes três pilares deve ser um só – a longevidade.

Para conseguir cumprir com sucesso uma agenda de ambidestria alinhada com os pontos acima citados é necessária a adição de duas frentes de atuação:

1) Os três stakeholders mencionados devem trilhar juntos uma jornada de educação no tema de ambidestria com foco em contexto e change management; metodologias e ferramentas.

2) Cada um, individualmente, deve trilhar também a sua jornada pessoal de desenvolvimento, por meio do que chamamos coaching de ambidestria. O coaching de ambidestria tem como principal objetivo fazer uma avaliação individual para identificar e atacar modelos mentais que possam prejudicar a sua jornada pessoal em ambidestria.

Além disso, deve identificar lacunas de competências, principalmente comportamentais, que precisam ser trabalhadas. Por meio de um instrumento de Assessment (utilizamos e recomendamos o IAG – Índice de Análise de Gestão), identifica-se o nível em que o avaliado se encontra, em cada fator de um conjunto, que contempla a gama dos fatores gerenciais, capazes de impulsioná-lo na direção do objetivo específico para o desenvolvimento da ambidestria.

O processo de coaching de ambidestria explora como os participantes do processo se encontram diante dos seguintes aspectos:

1. Timming para adaptação às novas condições.

2. Processo evolutivo da organização atual e a sua viabilidade em um processo de mudança.

3. Dificuldade de alinhamento do já existente com as possibilidades futuras.

4. Nível de flexibilidade e de apoio do indivíduo e de sua estratégia para o novo.

5. Sentimento de segurança do indivíduo e de seu corpo diretivo em relação ao novo momento.

6. Ponto focal de atuação do profissional e de seus interlocutores.

O objetivo final do processo de coaching é dar suporte e preparar o indivíduo para o enfrentamento desta nova abordagem estratégica para trabalhar, simultaneamente, unindo as funções de Exploitation (construção de capacidades e recursos para gerenciar o presente) e Exploration (construção de capacidades e recursos para gerenciamento do futuro) de sua organização considerando as dimensões existentes, apresentadas no Arquétipo da ambidestria, abaixo.

Matriz de capacidade de uma organização ambidestra

Como avaliar o ponto em que uma empresa está no tocante à jornada de ambidestria? Um dos temas mais críticos é saber onde se está para, após isso, definir os caminhos estratégicos da jornada.

O quadro seguinte propõe uma análise detalhada dos eixos a considerar na jornada, sendo que o ideal é garantir o equilíbrio entre os dois polos (Escala & produtividade vs. Velocidade & criatividade).

O resultado obtido com base nesta análise permite a definição correta da jornada a ser seguida pelos atores empresariais.

A ambidestria é, então, um novo modelo de atuação que suporta o sucesso empresarial e que coloca frente a frente contextos aparentemente antagônicos, mas sobretudo complementares.

Não é fácil definir e implementar uma jornada de ambidestria, mas ela é a distância que separa uma organização do sucesso e da longevidade do insucesso e da falência.

Resumo

A Quarta Revolução Industrial chegou para mudar completamente a gestão dos negócios, intensificando, como nunca, a necessidade de cuidar do negócio e estrutura atuais, olhando para negócios emergentes e estruturas futuras. É o que chamamos de ambidestria. Como definir e implementar uma jornada de ambidestria, superando princípios gerados na Segunda Revolução Industrial e que ainda se perpetuam em muitas empresas? É o que exploramos neste artigo.

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