Uma mobilização envolvendo governo, empresas, ciência e sociedade civil é necessária para que a COP30 no Brasil seja bem-sucedida. E esses esforços precisam ser intensificados a partir de agora com base nos resultados e aprendizados da COP28 em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. “A COP29, que será realizada em Baku, no Azerbaijão, deve ser de transição entre a COP28, que produziu o primeiro global stocktake, reconhecendo de forma inédita a necessidade de transição dos combustíveis fósseis, e a COP30, no Brasil, considerada a COP da natureza, cujas expectativas da comunidade internacional são enormes por causa da Amazônia e de todos os ativos naturais do nosso país”, diz Ricardo Assumpção, CSO (Chief Sustainability Officer) da EY e líder de ESG e Sustentabilidade.
Para que toda essa expectativa seja atendida, trazendo visibilidade positiva para o país, o Brasil precisa em primeiro lugar cumprir suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês) atualizadas em outubro deste ano na Cúpula de Ambição Climática realizada pela ONU (Organização das Nações Unidas) em Nova York. “Como essa mudança estabeleceu para o país metas mais rígidas, ela foi muito bem recebida internacionalmente. O sucesso de limitar o aquecimento global a 1,5ºC, conforme definido no Acordo de Paris, depende que os países cumpram efetivamente suas NDCs, que têm caráter voluntário”, explica Ricardo.
O Brasil definiu como meta para 2025, ano em que sediará a COP30 em Belém (PA), uma redução de 48,4% das suas emissões líquidas de gases de efeito estufa em comparação com 2005 e, para 2030, de 53,1% também em relação a 2005. Ambas as metas só serão cumpridas se o país reduzir o desmatamento da Amazônia, motivo pelo qual essa tem sido a prioridade do governo.
Considerando o enorme engajamento da iniciativa privada na COP28, as empresas já se deram conta do papel central da sustentabilidade no negócio. Para a COP30, elas precisarão dar um passo à frente, incorporando de fato a sustentabilidade no dia a dia, e isso só pode ser feito se for enxergada como uma área transversal, que perpassa todo o negócio. As organizações avançadas nessa agenda, de acordo com o “Sustainable Value Study”, divulgado pela EY, estão percebendo valor nos investimentos realizados. “O novo normal passará a ser quem incorpora a sustentabilidade na sua estratégia corporativa, já que as empresas bem-sucedidas nesse trabalho, conforme constatou esse estudo recente, estão vendo como resultado o ganho de valor junto aos stakeholders, além do aspecto financeiro e de colaboração com o planeta”, diz Ricardo.
Olhar para o Chile
O que pode contribuir para isso, de acordo com Elanne Almeida, sócia-líder de Consultoria e Sustentabilidade para LATAM da EY, é reunir empresas de diferentes atividades econômicas para discutir pautas ligadas a como cada setor está em termos de emissão de gases de efeito estufa; se existe um inventário de emissões; onde cada setor quer chegar em termos de sustentabilidade; quanto pode ser reduzido em termos de emissões considerando a tecnologia e os mecanismos disponíveis; e o que cada setor precisa para ser net zero (emissão líquida zero de carbono), contribuindo assim para que o país também seja.
A executiva levantou esses pontos com base na sua experiência no Chile, que se preparou com sucesso para receber a COP25 em 2019, mas que, na última hora, precisou desistir por causa de manifestações em todo o país que causaram instabilidade social. Ela liderou um grupo de mais de 1,2 mil pessoas ao longo de seis meses, incluindo representantes de oito setores industriais, como finanças, agropecuária, transporte, energia e mineração, além dos meios acadêmico e científico.
“Três temas foram transversais a todos os setores: política governamental clara; mecanismos de financiamento; e tecnologia. Para transporte, por exemplo, o desafio é transformar sua matriz energética, com destaque para as companhias aéreas, que estão atentas ao SAF (Combustível Sustentável de Aviação). Já o agro tem dado atenção para mecanismos de aproveitamento da biomassa”, diz Elanne. “Para o governo, a pergunta principal é se existem mecanismos de incentivo financeiro para possibilitar, por exemplo, que a indústria renove suas máquinas e processos. Todo esse planejamento integrado com o setor privado em nível nacional contribuirá para o sucesso da COP30”.
Contribuição das instituições financeiras
Para Rafael Schur, líder do segmento de Mercado de Serviços Financeiros para o Brasil da EY, o setor financeiro pode contribuir bastante com esse processo, especialmente em relação às emissões do Escopo 3, que são referentes aos fornecedores e clientes. “Enquanto emissor primário de carbono, o setor financeiro contribui pouco para as emissões totais. Seu grande impacto é gerado pelo Escopo 3, que está associado à sua cadeia de valor”, diz. “Diferentemente de outras indústrias, que olham muito no Escopo 3 para os fornecedores, a financeira está voltada para a carteira de clientes. O crédito concedido será usado por empresa que emite muito carbono? O seguro que faço será subscrito por indústria que emite muito carbono? Essas são perguntas que devem ser feitas nesse contexto, com os bancos trabalhando com seus clientes para vincular os recursos aos produtos e serviços que exijam comprometimento para reduzir emissões”.
Ainda segundo Schur, o desafio até a COP30 está em escalar rápido esses instrumentos, disponibilizando mais crédito atrelado a essa agenda de redução de carbono, além de produtos e seguros que tenham impacto positivo em termos de clima. “O ganho de velocidade está muito vinculado à valorização dessa agenda por parte da sociedade, incluindo as próprias empresas, bem como pelos órgãos reguladores incorporando essas práticas nas regras, sem que esqueçamos da necessidade de haver retorno financeiro efetivo para as organizações nesse novo modelo de fazer negócios”.