De acordo com o estudo global Trabalho Reimaginado 2023 da EY, 68% dos empregadores concordam que uma economia desacelerada deve reduzir a propensão de saída de seus funcionários. Já para os empregados, a perspectiva é diferente: mesmo diante de uma piora na economia, 37% deles afirmam que a propensão de deixar um emprego permanece a mesma. Essa dicotomia é uma questão de visão de mundo. Nem sempre aquilo que se deseja é possível ou viável, pelo menos a curto prazo.
Toda a agenda de crescimento das empresas considera o cenário macroeconômico, o ambiente de risco, as características do seu mercado e do volume de negócios. Se o mercado desacelerou e não está tão demandante, as projeções de crescimento estarão mais comedidas para os próximos anos.
Consequentemente, projeta-se uma retração na contratação de pessoas e um menor investimento em expansão de times. As empresas não vão apostar em uma maior rotatividade de funcionários, independente do modelo de trabalho.
O que percebemos no dia a dia é que as organizações que estão demandando uma volta aos escritórios seguem com uma taxa de turnover baixa. Em um cliente de tecnologia recentemente atendido pela EY, a quebra na taxa de turnover foi de menos de 3% após 12 meses de adoção do modelo híbrido “office first”.
Os funcionários são mais propensos a permanecer na empresa se tiverem a flexibilidade de escolher suas horas de trabalho e localização?
Independente das previsões de turnover e favorabilidade de saída de empregados a curto prazo, a flexibilidade veio para ficar. Está claro que os modelos de trabalho estão sendo questionados e motivando profissionais a reavaliarem suas posições e estilos de vida.
Do lado dos empregadores, é preciso assimilar de modo perene os aprendizados dos últimos anos para manter a sustentação empresarial a longo prazo, sem reagir às mudanças de modo refratário. O único porém é que flexibilidade não é sinônimo de trabalho remoto.
Posto isso, tanto empregados quanto empregadores entendem que os modelos de trabalho precisam melhorar e há uma busca por uma alternativa ótima, que acomode ambas as partes e equilibre produtividade e qualidade de vida. Todavia, há entre os colaboradores uma percepção diferente sobre a velocidade das mudanças, refletindo uma certa ansiedade.
Isso tanto pode se converter em um desejo de mudança de emprego que aconteça em um momento mais propício, quanto pode causar desmotivação e impactos negativos imediatos em performance e resultados.
Ainda segundo o estudo, entre os empregadores, 79% concordam que suas companhias foram bem sucedidas ao implantar modelos de trabalho flexíveis, incluindo regras claras e suporte para a operação. Além disso, 75% afirmam que estão comprometidos a oferecer níveis adequados de flexibilidade aos funcionários.
Somente nos últimos 2 anos, ou seja, no pós-pandemia, o trabalho remoto em períodos específicos foi implementado de acordo com 45% dos entrevistados. Entre os empregados, 73% concordam que suas empresas estão comprometidas com as melhores práticas de flexibilidade.
Como a integração entre trabalho e vida, ao invés do equilíbrio entre essas duas esferas, impacta a rotatividade de funcionários?
Para os colaboradores, o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal continua extremamente importante, bem como o maior tempo dedicado à saúde e ao bem-estar como consequência ao menor tempo gasto no trânsito diariamente. Isso indica que as pessoas não querem perder o estilo de vida conquistado desde a pandemia.
Contudo, a tendência é que a ideia do trabalho remoto seja revista, ao mesmo passo em que as empresas precisam criar novos incentivos e melhorar os benefícios oferecidos onsite para atender às demandas por flexibilidade, garantindo a satisfação do colaborador enquanto ele trabalha no espaço físico da organização.
Segundo os empregadores, entre as melhorias e benefícios oferecidos para estimular a volta ao trabalho presencial estão creches e serviços de acolhimento aos filhos de funcionários (43%), mais dias de férias ou folgas remuneradas (34%) e horários/turnos flexíveis (34%).
Na percepção dos empregados, porém, somente os horários/turnos flexíveis (34%) estão entre as três mudanças mais citadas em termos de flexibilidade. Os outros dois pontos mais prevalentes são: alimentação no local ou benefícios de mobilidade/transporte ou remuneração.
Como a transformação digital da empresa impacta na rotatividade de pessoal?
De acordo com uma análise recente do FMI (Fundo Monetário Internacional), a inteligência artificial deverá afetar quase 40% de todos os empregos no mundo. A IA também deve aumentar significativamente a exigência de formação de profissionais em novas competências.
Nesse sentido, as áreas do conhecimento afetadas incluem o entendimento e gestão de novos riscos de segurança cibernética; questões éticas; combate à desinformação e inovações de modo geral, aprofundando a revolução tecnológica e levando-a a um patamar jamais visto.
Desse modo, uma cultura de aprendizado contínuo e o aprimoramento de habilidades dos funcionários passa a ser uma preocupação para empresas e pessoas, envolvendo investimentos de parte a parte. Contudo, segundo pesquisadores do MIT, apenas 23% tarefas com ampla compatibilidade técnica são economicamente viáveis para serem implementadas dentro de um futuro próximo.
Isso significa que as empresas precisam construir alternativas realistas, não simplesmente criar projetos de IA sem visão de causa raiz ou por modismos tecnológicos. Como consequência, priorizar as competências realmente importantes é fundamental para a capacitação de profissionais.
Esse senso de realidade é o primeiro passo para atrair e reter talentos motivados, engajados e focados no que realmente importa, reduzindo as chances de turnover. Face à velocidade das mudanças, é necessário identificar e priorizar as competências mais importantes para o negócio, os resultados e para a visão das empresas a médio prazo. Do contrário, desperdício de tempo e recursos levarão ao aumento da frustração de ambas as partes, podendo elevar o turnover e reduzir a produtividade.
Não há fórmulas prontas: nem tudo o que vale para uma empresa, vale para a outra. Como, então, caminhar mais rápido e com segurança ao mesmo tempo? Para muitas organizações, essa pode ser uma espécie de "escolha de Sofia": ou uma coisa, ou outra. O caminho, porém, é sempre o do meio. Não é necessário mudar tudo, ainda mais de uma vez só. Não precisamos ser disruptivos o tempo todo ou rasgar tudo o que já fizemos e jogar fora.
Como uma empresa pode garantir a satisfação no trabalho e manter os funcionários engajados em um ambiente de trabalho reimaginado?
Motivação e engajamento pessoal têm impactos tanto em produtividade quanto em turnover dentro das empresas. Quanto maior a clareza de direcionamentos, menor será a propensão das pessoas a deixarem as empresas. É fundamental que cada indivíduo entenda a importância do que faz para todo o grupo, compreendendo o que é prioridade dentro da empresa.
A visão 360 graus sobre próximos passos, como cada pessoa se conecta, o que é esperado de cada um e como a empresa pode ajudar no desenvolvimento das pessoas é muito importante. Responsabilidades, papeis, expectativas e recursos precisam estar constantemente alinhados.
O excesso de direcionamentos e estímulos cansa e desmotiva as pessoas, pois elas perdem clareza sobre o que fazer. É frustrante chegar ao final do dia sem conseguir concluir tarefas pelo excesso de demandas, congestionamento dos canais de comunicação digitais ou simplesmente por não conseguir tocar adiante seus projetos que requerem mais concentração e dedicação.
Mais uma vez: só precisamos focar no que afeta a produtividade. É preciso simplificar e não interromper as pessoas com aquilo que não tem valor, separando fatos de euforia.
Quais as demais estratégias para evitar o turnover?
Pensar o futuro do trabalho e dos negócios também passa por ouvir as pessoas, captar a visão dos grupos, dos times e dos clientes para tomar decisões mais acertadas, de modo menos randômico e mais intencional. É importante organizar as agendas para que as pessoas ajam com consciência, autonomia e confiança dentro das empresas, aliando alta performance e retenção de talentos.
Há pesquisas que reportam que muitos colaboradores preferem o trabalho remoto para ficar mais longe de gestores tóxicos ou de um ambiente de "bagunça corporativa", sem clareza, com acúmulo de tarefas que parecem sem sentido e com muito desperdício de tempo.
Dentro da Economia do Conhecimento, a tão citada Síndrome de Burnout deriva dos excessos: precisamos entender que a nossa capacidade cognitiva de consumo de informação é muito menor do que a velocidade com que tamanha rede de informação é criada.
Como consequência, menor ainda é nossa capacidade de transformar tudo isso em conhecimento. Essa sensação de esgotamento é legítima e cabe às empresas e gestores levá-las a sério, permitindo que as pessoas tenham foco no que mais importa, sendo mais produtivas e felizes no trabalho, se desenvolvendo ao mesmo passo em que cooperam para o progresso da organização.
Resumo
Para enfrentar o turnover e garantir a retenção de talentos em um ambiente de trabalho reimaginado, as empresas precisam encontrar um equilíbrio entre flexibilidade e estrutura, atendendo às necessidades dos funcionários e mantendo a produtividade. A flexibilidade é crucial para a retenção, mas deve ser implementada de forma realista e sustentável. A transformação digital exige uma cultura de aprendizado contínuo e foco nas competências mais relevantes para o futuro do trabalho. Além disso, evitar o burnout e garantir um ambiente de trabalho saudável são fundamentais para a satisfação e engajamento dos funcionários. Ouvir os funcionários, simplificar processos e proporcionar clareza nas expectativas e responsabilidades são passos essenciais para reduzir o turnover e garantir a longevidade do talento nas empresas.