Futuristic skyscrapers in Midtown Manhattan on a sunny day.

O sonho da simplificação tributária que a reforma pode não endereçar

Tópicos relacionados

É essencial que pontos e vícios do sistema atual sejam discutidos na futura lei complementar que regulamentará os novos tributos.

Muito aguardada, a reforma tributária foi finalmente aprovada, após intensos debates no Congresso. Notoriamente classificado como um dos sistemas tributários mais complexos do mundo, o arcabouço legislativo de tributos indiretos do Brasil sofrerá grandes alterações nos próximos anos.

Um dos grandes pilares norteadores da reforma é a simplificação do sistema atual, no qual coexistem cinco tributos (PIS, Cofins, ICMS, IPI e ISS) que possuem hipóteses de incidência, regras, base de cálculo e alíquotas distintas. Eles seriam substituídos por dois tributos principais, a CBS e o IBS (o primeiro de competência federal e o segundo de competência municipal e estadual) e mais três tributos: o imposto seletivo, a contribuição estadual e o IPI, que se aplicará apenas para diferenciar produtos da Zona Franca de Manaus. No entanto, ainda restam pontos importantes, cuja regulamentação ficou para a lei complementar e que podem comprometer justamente a tão aguardada simplificação.

Entre eles, temos a abrangência do imposto seletivo, ou excise tax, utilizado pelo governo para taxar produtos cujo consumo deseja-se desestimular. Deveria funcionar como mecanismo de controle, podendo seus recursos serem utilizados para o custeio de gastos públicos causados pelas externalidades negativas dos produtos e serviços que tributa.

No entanto, considerando o texto aprovado da reforma, a abrangência do imposto seletivo preocupa (e muito) diversos setores, porque poderá incidir sobre todos os bens e serviços que são prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Isso torna sua hipótese de incidência extensível a uma gama enorme de produtos, abrindo margem para que tal imposto seja usado com propósito unicamente arrecadatório, sem considerar a finalidade para a qual foi instituído.

Outro ponto está ligado à permanência da substituição tributária. Utilizada atualmente para o ICMS, essa metodologia de concentração do imposto devido ao longo da cadeia teve sua aplicação estendida nas últimas décadas para uma enorme variedade de produtos e serviços. Apesar de trazer a simplificação sob o viés da arrecadação, os contribuintes enfrentam diversos desafios em sua aplicação, que vão desde a identificação dos parâmetros de tributação (que diferem em cada Estado) até as formas e prazos de ressarcimento de valores eventualmente acumulados, situação essa que é comum. O texto, conforme aprovado, abre margem para a continuidade dessa complexa metodologia após a implementação da reforma, uma vez que estabelece que a lei complementar poderá definir o sujeito passivo do imposto responsável pelo recolhimento, o que gera dúvidas e preocupação se de fato haverá o fim desse mecanismo.

Outra problemática que se visa a eliminar com a reforma está relacionada aos resíduos tributários (ou seja, valores de tributos que incidiram em etapas anteriores da cadeia e que não geraram créditos), que oneram o valor dos produtos e serviços como um todo. Antes da aprovação, a ideia era que os créditos fossem amplos e irrestritos no novo sistema, contudo, algumas limitações impostas preocupam, como é o caso da definição dos itens de uso pessoal (ou seja, qual seria a abrangência desse conceito) e também no caso de regimes diferenciados de tributação. Para esse último, por exemplo, no caso dos combustíveis, ainda é incerto se uma empresa que compra tais produtos para uso como insumo em suas atividades poderá descontar os respectivos créditos, visto que tais itens estarão sujeitos à sistemática diferenciada de tributação.

Por fim, restam ainda muitas incertezas sobre o período de transição. O que temos como certo até o momento é o fato de que a adaptação às novas regras envolverá custos adicionais, relativos à adaptação de sistemas fiscais e contábeis, reestruturações de equipes e ajustes no processo de conformidade fiscal. Ademais, haverá necessidade frequente de se revisitar a metodologia de precificação dos bens e serviços, assim como a cadeia de suprimentos e distribuição atualmente adotada.

Assim sendo, existe um temor grande por parte dos especialistas do mercado de que a simplificação (tão desejada, necessária e esperada pela sociedade como um todo) não se concretize no curto prazo e tampouco após o período de transição. Afinal, muitos dos pontos e vícios que existem no sistema atual podem ser perpetuados após a reforma.

Portanto, é essencial que tais pontos sejam bem endereçados no âmbito da discussão da futura lei complementar que regulamentará os novos tributos, para que o sonho de simplificação do sistema tributário brasileiro não seja em vão.

Resumo

A simplificação do sistema atual é única unanimidade até então quanto à Reforma Tributária sobre o Consumo no Brasil, no entanto, outros pontos que não foram endereçados no texto atual podem comprometer essa simplificação e as empresas precisam estar atentas. O presente artigo destaca quais são.

Sobre este artigo