Do que trata a CS3D?
Em 24 de abril de 2024, o Parlamento Europeu aprovou o texto final da Diretiva de Due Diligence em Sustentabilidade Corporativa (CS3D). Esta Diretiva estabelece obrigação ampla de dever de cuidado das empresas Europeias para prevenir, mitigar e remediar impactos negativos sobre os direitos humanos e o meio ambiente - seja em suas operações na União Europeia ou por meio de seus fornecedores em âmbito global.
A CS3D detalha a extensão desse dever de cuidado e responsabilidades, e institui a adoção mandatória de um sistema de due diligence, pelas empresas, como a principal ferramenta de implementação da Diretiva. Apesar da publicação do texto oficial da CS3D ser esperada para os próximos meses, o texto aprovado permite que empresas e especialistas se preparem para atender as novas obrigações.
Quais empresas estão sujeitas à CSDDD e como ela alcança operações no Brasil?
Apesar de a Diretiva obrigar diretamente empresas europeias, a norma alcançará empresas brasileiras (ou com operação no Brasil) que participam da cadeia de atividades daquelas – por exemplo, na extração de minerais, na originação de commodities agrícolas, transporte, armazenamento e manufatura de produtos.
As empresas europeias abrangidas (e, indiretamente, suas cadeias de atividades) são:
1. Empresas da UE (ou subsidiarias controladas) com mais de 1.000 funcionários e faturamento líquido global de mais de 450 milhões de euros; e
2. Empresas não pertencentes à UE (ou subsidiarias controladas) com faturamento líquido de mais de 450 milhões de euros na UE, independentemente do número de funcionários.
Neste primeiro momento, as instituições financeiras estão sujeitas apenas às obrigações de due diligence para sua cadeia upstream, ou seja, não abrange clientes (as empresas que recebem seus serviços financeiros).
No Brasil, proposta semelhante está em discussão na Câmara dos Deputados, que pretende estabelecer a responsabilização civil das empresas por sua cadeia de fornecedores (Projeto de Lei n. 572/2022 - Marco nacional sobre Direitos Humanos e Empresas).
Quais as obrigações de due diligence?
A CS3D incorporou as boas práticas da OCDE para Conduta Empresarial Responsável, compreendendo um dever de cuidado baseado nas seguintes obrigações para prevenir violações aos direitos humanos e impactos negativos ao meio ambiente:
- Implementar uma política de due diligence baseada em risco e integrada às práticas empresariais, revisando-a bienalmente;
- Conduzir uma avaliação detalhada das atividades empresariais para identificar e priorizar impactos adversos, reais ou potenciais, no âmbito social e ambiental, mobilizando recursos suficientes e engajando stakeholders (parceiros comerciais, comunidades locais, consumidores etc.);
- Desenvolver e executar um plano de ação preventivo com cronograma e metas claras, utilizando indicadores qualitativos e quantitativos para monitorar o progresso.
- Obter compromissos contratuais de parceiros diretos, incluindo verificações de conformidade por terceiros;
- Mitigar ou neutralizar impactos adversos identificados por meio de ações corretivas, ajustes contratuais e operacionais, e fornecer remediação em caso de danos, atuando diretamente ou influenciando parceiros comerciais;
- Criar e manter um canal transparente e acessível de denúncias e reclamações.
Complementarmente, com relação às mudanças climáticas, as grandes empresas da UE serão obrigadas a adotar um plano de transição para assegurar a compatibilidade do seu modelo de negócios com a limitação do aquecimento global a 1,5°C.
Impactos na governança das empresas
Entendemos que, para cumprimento do “dever de cuidado” estabelecido na Diretiva, as empresas terão que envolver suas instâncias de alta administração e deliberação internas. Isso porque a due diligence deverá ser integrada a políticas internas de risco, cadeia de fornecedores, direitos humanos, meio ambiente, compras e aquisições. Ainda, as empresas terão que designar internamente um “representante autorizado”, que será responsável pela implementação da Diretiva, por responder aos órgãos fiscalizadores dos Estados-Membros e por colaborar com estes.
Quais as penalidades em caso de não cumprimento?
As empresas podem ser responsabilizadas pela reparação integral dos danos causados a uma pessoa física ou jurídica em caso de não conseguir, de forma intencional ou por negligência, prevenir e mitigar seus impactos adversos. Essa responsabilização é antecedida pelo dever de cuidado amplo de prevenir e mitigar impactos reais e potenciais. As empresas também estão sujeitas a multas e outras formas de sanção definidas pelos Estados-Membros. Nota-se que uma empresa não pode ser responsabilizada por danos causados exclusivamente por seus parceiros comerciais em sua cadeia de atividades. Contudo, poderá ser responsabilizada caso tenha falhado em seu dever de cuidado e efetiva influência sobre seu parceiro de negócio.
Implementação e fiscalização
Caberá a cada Estado-Membro adequar suas normas e órgãos administrativos para implementação da Diretiva, o que deve ser feito em até dois anos. Para fortalecer a implementação, a CS3D estabelece uma série de instrumentos, como a criação de canais de denúncias e queixas, o sistema de cooperação entre autoridades nacionais para compartilhamento de informações, e a criação de listas indicativas de empresas situadas em outros países que estão sujeitas à norma. Futuras diretrizes para implementação serão desenvolvidas pelas Agências Europeias do Trabalho, do Ambiente e dos Direitos Fundamentais.
Como sua empresa deve se preparar?
Entendemos que a obrigação de dever de cuidado será “cascateada” junto aos participantes da cadeia de atividades no Brasil, obrigando estes a possuírem controles efetivos para evitar e mitigar violações aos direitos humanos e impactos ao meio ambiente.
Esperamos também uma postura mais ativa e maior protagonismo das empresas da UE em monitorar, verificar e diligenciar junto aos seus fornecedores – inclusive com um apetite menor a risco, que se traduzirá em critérios rigorosos e controles internos mais efetivos junto aos parceiros comerciais.
Em termos práticos, será necessário desenvolver e implementar um sistema de due diligence robusto e efetivo para detectar não-conformidades e impedir danos atuais e potenciais – inclusive para demonstrar que o dever de cuidado foi adotado, e que eventual impacto adverso se deve por conduta exclusiva do parceiro comercial.
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