Desde 1º de janeiro, as empresas multinacionais estão sujeitas ao chamado imposto mínimo global, que faz parte do Pillar 2, iniciativa da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) que contou com a adesão de 140 países para implementação de um tributo em comum. Os grupos multinacionais com volume global de negócios superior a 750 milhões de euros devem recolher a título de imposto sobre a renda uma alíquota efetiva de pelo menos 15% em todas as jurisdições em que atuam. A estimativa da OCDE é que o imposto mínimo global aumente, em todo o mundo, a receita tributária anual em até 9% – o equivalente a US$ 220 bilhões.
"Um dos objetivos dessa regulamentação é evitar que as empresas façam planejamento tributário que reduza consideravelmente a carga tributária incidente sobre suas operações globais por meio do uso, por exemplo, das possibilidades oferecidas pelos paraísos fiscais", diz Rita Martins, sócia da área internacional de impostos da EY, que participou do evento “Tax Day – Perspectivas Tributárias 2024” promovido em São Paulo pela empresa de auditoria e consultoria. Vários países considerados paraísos fiscais terão de se adequar à nova regra, como Irlanda, Luxemburgo, Suíça e Barbados, o que significa que também deverão cobrar o tributo criado na alíquota definida. "É possível dizer que antes as empresas conseguiam pagar de tributo sobre a renda algo próximo de zero, mas agora, com essas novas regras, a alíquota mínima efetiva passará a ser 15%”, completa Rita. União Europeia, Reino Unido, Noruega, Austrália, Coreia do Sul, Japão e Canadá são as primeiras jurisdições aplicando o imposto mínimo global.
O Brasil, assim como Estados Unidos e China, ainda não criou sua legislação para contemplar o tributo. "Como vimos recentemente com o preço de transferência, cujo alinhamento do Brasil às regras da OCDE começou neste ano, o país deve continuar se adequando à legislação tributária internacional com o objetivo de melhorar sua inserção na cadeia global de valor, incentivando assim investimentos em diversos setores econômicos", afirma Priscila Vergueiro, sócia da área internacional de impostos da EY.
Impactos já estão sendo observados
De qualquer forma, como pontuam Rita e Priscila, ainda que o Brasil não tenha regulamentado o imposto mínimo, as empresas multinacionais atuantes no país e as multinacionais brasileiras com atuação em outros países já estão sentindo os impactos. "Isso porque, no primeiro caso, estamos falando de subsidiárias de empresas do exterior onde a legislação já foi implementada e, no segundo, sobre as empresas brasileiras que estão presentes nas principais jurisdições globais, que também já contam com o imposto mínimo", completa Rita. Ainda segundo as executivas, é relevante observar neste primeiro momento como se dará essa uniformidade das jurisdições em relação ao tributo que está sendo implementado em âmbito global.
Como as regras tributárias são compartilhadas pelas jurisdições, os grupos multinacionais precisam coletar informações de suas subsidiárias que comprovem a conformidade com a tributação mínima exigida. Caso a alíquota efetiva mínima de 15% não seja atingida em alguma jurisdição onde está presente, a multinacional precisa recolher imposto adicional, compensando assim o não atingimento do mínimo exigido.
Novas regras do preço de transferência
As novas regras do preço de transferência alinhadas com as da OCDE já estão em vigor no Brasil. A Instrução Normativa 2.161/2023, publicada no fim de setembro, regulamenta essas exigências definidas na Lei 14.596/2023. Nesse novo contexto, o trabalho de compliance das empresas está sendo mais demandado porque aumentam as exigências sobre as informações que devem ser demonstradas para a Receita Federal, incluindo a forma de documentação das operações. Por passar a ser uma análise muito mais econômica para entender os riscos e benefícios das operações, o compliance deixa de ser uma avaliação feita apenas por advogados e contadores. O time de negócios, como os economistas, passa a integrar esse trabalho, trazendo a contribuição de entender a participação de cada parte envolvida nas operações.
No método anterior do preço de transferência, o conhecimento do balanço da empresa se mostrava suficiente. Já no novo método alinhado ao da OCDE, é preciso compreender todo o negócio, todas as transações realizadas, documentando adequadamente cada uma delas. Essa nova dinâmica altera as análises funcionais realizadas pelas empresas, como se elas mantêm estrutura no Brasil e se passam a trabalhar com royalties e despesas diferentes no exterior ou aqui no Brasil.