Quando o setor privado discute governança e divulgações climáticas e financiamento da nossa transição para economia de baixo carbono, a gestão de gases de efeito estufa ocupa posição proeminente, usualmente via instrumento de mercado mais difundido globalmente, que são os mercados de carbono regulados e voluntários. Quando o governo federal define as diretrizes de desenvolvimento econômico do país pautadas em um “Plano de Transformação Ecológica”, no Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), e leva ao G20 o desenvolvimento sustentável como uma das diretrizes de trabalho durante sua presidência, voltamos ao mercado de carbono como um dos protagonistas da discussão.
Mas conhecemos o longo caminho para o nascimento da lei de mercado de carbono no Brasil. Se quisermos acelerar uma decisão em prol do nosso país, é fundamental haver uma articulação no Poder Legislativo, chegando a um texto para ser publicado ainda durante o primeiro semestre de 2024 (nossa janela de oportunidade política, já que temos eleições no segundo semestre).
Mão na massa
Sendo assim, por que as empresas não estão se preparando setorialmente para definir ações, volumes e cronograma viável para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa?
Termos ou não uma lei de mercado de carbono regulado, neste momento do mundo, não deveria ser a motivação para que as empresas se organizem e definam uma governança climática setorial.
Há uma demanda clara e factual por parte dos detentores de capital para avaliar riscos climáticos como condicionante para as alocações, sejam nossos bancos, seja o mercado de capitais (principalmente estrangeiro), sejam as seguradoras. Há reporte mandatório de riscos financeiros de sustentabilidade e clima para nossas empresas de capital aberto logo ali, em 2026.
Há mecanismo de ajuste de carbono na fronteira (taxação) para nossas exportações de cimento, ferro, aço, alumínio, fertilizantes, eletricidade e hidrogênio também logo ali, em 2026, e com fase de transição de reporte mandatório já em vigor desde outubro de 2023.
Há obrigação de comprovação de operação livre de desmatamento (ou seja, sem emissão de gases de efeito estufa por alteração do uso da terra) via rastreamento da cadeia de valor de carne, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira e de produtos deles derivados a serem exportados para a Europa a partir de dezembro deste ano.
Isso sem contar as perdas já materializadas decorrentes de riscos físicos climáticos que vêm sendo anunciadas por setores diversos.
Enquanto a FAO informa que a agroindústria perdeu US$ 3,8 trilhões nos últimos 30 anos devido a eventos climáticos e que precisamos de governança climática urgente na gestão de dados climáticos para o agro, a Swiss Re avalia o crescimento das perdas relacionadas a eventos climáticos e a expectativa de crescimento de perdas em razão do aumento da temperatura como “to dos” tanto da adaptação (preparação para enfrentar a materialização dos riscos climáticos) quanto do seguro e da mitigação (gerenciamento da causa dos problemas, ou seja, redução da emissão de gases de efeito estufa).
Esperar sentados?
Sentar e esperar pela publicação da lei de mercado de carbono não me parece minimamente razoável, quiçá condizente com o cenário de comércio internacional ou, pior, com as próprias metas climáticas divulgadas e compromissadas por muitas das empresas brasileiras.
Empresas que têm metas climáticas divulgadas deveriam estar liderando sua organização setorial com discussão objetiva e fundamentada, no mínimo, nos planos de mitigação de gases de efeito estufa.
Mesmo que considerássemos a hipótese de que sentar e esperar fosse uma opção minimamente razoável, uma vez que não há definição de linhas de base setorial de emissão de carbono, nem indicação de volumes ou cronogramas factíveis, será que o setor privado aventou a possibilidade de ser presenteado com um decreto com tais disposições em um horizonte próximo? Não seria mais condizente com as estratégias corporativas climáticas ter a linha de base acordada com seu setor, assim como cronograma e volumes para sentar e discutir com o governo?
Há sempre duas opções: liderar ou ser liderado. O que estamos esperando?
*Este artigo foi publicado inicialmente na Capital Reset.