As diversas formas de tributação sobre o carbono, em particular, as implementadas ao nível dos Estados-Membros da União Europeia, adquirem um desejável e potativo efeito espelho (ou de soma positiva), no sentido do combate à redução do risco de “fuga de carbono”[1] dos parceiros comerciais globais da União Europeia, os quais, nos setores e produtos impactados, são fortemente incentivados a descarbonizarem pelo menos para manter essa mesma parceira em nível satisfatórios, com a efetivação do Mecanismo de Ajustamento Carbónico Fronteiriço, já em 2026.
Acompetitividade das indústrias europeias no contexto internacional é diretamente impactada pela fiscalidade (direta, indireta e demais tributação – taxas, contribuições ou outras figuras tributárias avulsas), as quais, paralelamente aos impostos e nos respetivos montantes impendem sobre cada serviço, e no que à presente análise importa, sobre cada bem.
No que ao Mecanismo de Ajustamento Carbónico Fronteiriço (CBAM, sigla em inglês) se refere, a expetativa é a de que, através, deste instrumento de política fiscal “ambiental”, mesmo entidades incorporadas ou estabelecidas em territórios terceiros sejam positivamente influenciadas pela fiscalidade verde da União Europeia (“UE”), a qual, ao se aplicar às fluxos in an out, across countries (lógica exportação/importação para a UE) implicam que todo o comércio à escala global se adapte.
Em particular, a experiência prática mais significativa é a de diversos exportadores da Ásia e Médio Oriente, os quais têm vindo proativamente a adaptar-se ao facto de que o CBAM, ao ser cobrado sobre as emissões que ocorrem aquando do fabrico fora da UE e no envio desses bens para a UE, impacta o próprio preço de entrada desses bens antes dos impostos ditos tradicionais. Logo, a competitividade dos exportadores não europeus depende dessa mesma capacidade de adaptação (por via da deslocalização da produção ou pelo investimento em tecnologia limpa).
Embora o cunho influenciador do CBAM, este impactará de forma diferente os países exportadores para a UE, consoante os bens sejam de mais elevada intensidade de utilização de carbono, os respetivos padrões comerciais e as políticas de fixação de preços do carbono vigentes.
Ora, o CBAM deverá fixar os preços do carbono equivalente para as importações e para os produtos nacionais, mas, de um modo diferente do instrumento existente (CELE - Comércio Europeu de Licenças de Emissão - EU ETS - que se aplique a instalações na UE), uma vez que o CBAM deverá aplicar-se a determinadas mercadorias importadas na UE.
De facto, as empresas que importem produtos sujeitos ao CBAM terão de solicitar o estatuto de “declarante CBAM autorizado” para realizarem essas importações e terão de adquirir e entregar certificados CBAM numa base anual, correspondentes à quantidade de emissões diretas nos produtos importados. Não obstante, durante o período transitório, compreendido entre 1 de outubro de 2023 e 31 de dezembro de 2025, as obrigações do importador ao abrigo deste regime limitam-se às obrigações de comunicação de informações numa base trimestral.
De qualquer forma, as empresas multinacionais (em particular que operem a partir de países terceiros) devem interrogar-se sobre - Estamos a importar para a UE, produtos que podem ser abrangidos pelo âmbito do CBAM? Utilizamos produtos que possam ser abrangidos pelo âmbito do CBAM e que são adquiridos a fornecedores não UE? Estamos a adquirir bens fabricados na UE, que incluem matérias-primas que estarão sujeitas ao CBAM? Estamos a produzir bens que podem ser abrangidos pelo âmbito do CBAM, fora da UE, para clientes na UE? Atuamos como representante aduaneiro (indireto) para importar mercadorias abrangidas pelo CBAM para qualquer outra parte?, cuja resposta afirmativa a uma ou mais, determinará a necessidade de avaliar o impacto da potativa aplicação deste mecanismo ao nível das transações que lhe fiquem sujeitas.
Tendo a designada fase de transição do CBAM, iniciado a 1 de outubro de 2023, com os primeiros reportes trimestrais a terem sido efetivados, em janeiro de 2024, findo o período transitório (ou seja, a partir de 1 de janeiro de 2026), as autoridades aduaneiras não irão autorizar a importação de mercadorias que não seja efetuada por um declarante CBAM autorizado e os importadores ou representantes aduaneiros indiretos terão de comprar certificados CBAM correspondentes ao preço do carbono que teriam pago, caso os bens importados tivessem sido produzidos sob as regras de preço de carbono da UE.
O CBAM abrange, para já, os bens dos seguintes setores: cimento, ferro e aço, alumínio, adubos (fertilizantes), hidrogénio e eletricidade (mas o âmbito de aplicação será alargado).
Uma vez totalmente implementado (1 de janeiro de 2026), os importadores da UE de bens abrangidos pelo CBAM terão de comprar certificados CBAM, cujo preço dos certificados será calculado do preço médio semanal do CELE; já os importadores/representantes aduaneiros terão de obter o estatuto “declarante CBAM autorizado” das autoridades competentes e cumprir com as respetivas obrigações declarativas e de reporte, ao nível da quantidade de bens importados para UE e a quantidade de emissões incorporadas nesses mesmos bens relativamente ao ano anterior.
Ademais, ficam adstritos a entregar o número de certificados CBAM que corresponde à quantidade de emissões incorporadas nos bens importados. Sendo que, numa lógica de evitar a incidência de dupla tributação (ambiental), se os importadores puderem provar, com base em informações dos produtores de países terceiros, que já foi pago um preço de carbono durante a produção dos bens importados, o montante correspondente em CBAM poderá ser deduzido.
Podemos apontar, desde já, como principais desafios que o CBAM impõe às empresas multinacionais, internamente, a identificação do responsável pelo processo CBAM, em termos de cumprimento das obrigações fiscais internacionais, a complexidade da conformidade com as regulações existentes e across countries, eficiente gestão e alocação de custos e recursos, (re)adaptação da cadeia de abastecimento, compliance and governance reportes.
Ainda de denotar os potenciais riscos de relações entre países (tensões comerciais, diplomáticas ou de estímulo ao incentivo à fixação de preços do carbono), com esperado impacto positivo ao nível da competitividade das empresas da UE face àquelas, aqui não estabelecidas e a nível de inovação tecnológica, determina, todavia, uma necessidade de harmonização fiscal global, ao nível dos preços do carbono e de evitar a dupla tributação (por exemplo por via de novos acordos internacionais).
Se esta via será suficiente para evitar eventuais retaliações comerciais por parte de países eminentemente exportadores impactados pois é algo que o engenho legislativo denotará, em qualquer caso, os países dentro dos limites dos acordos internacionais bi ou multilaterais efetuados podem legitimamente dispor dos instrumentos de direito fiscal ao seu dispor – da conveniência dos mesmos é algo que a praxis julgará.
No panorama geral, segundo dados oficiais do Eurostat desde 2013 que se observa um contínuo incremento das receitas anuais (M€) decorrentes de instrumentos fiscais ditos ambientais, com a Polónia, Noruega e a Suécia, em 2022, a serem osos países da UE com valores superiores a 300M€, cifrando-se Portugal em cerca de 84,39M€.
[1] O fenómeno de “fuga de carbono” ocorre quando as indústrias transferem a produção poluente para outros países com políticas climáticas menos rigorosas, ou quando os produtos da UE são substituídos por importações com maior intensidade de carbono.