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A evolução da tributação das empresas em Angola e a situação dos preços de transferência

Angola inova na tributação: o novo IRPC chega em 2025 para simplificar impostos e alinhar com padrões globais. Prepare-se para a mudança!

Angola prepara-se para realizar uma alteração estrutural ao seu regime de tributação das empresas, consolidando diversos códigos num movimento de transição de um sistema cedular para um modelo unificado.

Com essa mudança, que envolve a fusão total ou parcial de três códigos (Imposto Industrial, Aplicação de Capitais e Predial) num só diploma (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas-IRPC), o país dá um passo significativo na modernização e adaptação do seu sistema fiscal às melhores práticas internacionais.

A mudança alicerça-se na percepção das limitações de um sistema cedular, tipicamente mais complexo, gerador de múltiplas obrigações declarativas, custos de contexto elevados, propenso à geração de lacunas e áreas de difícil interpretação que suscitam um maior nível de insegurança jurídica, tanto a nível nacional como internacional.

A reforma proposta tem efeitos positivos nas diferentes áreas de especialização fiscal e, concretamente, nos preços de transferência. Sugere também uma trajectória positiva de alinhamento das regras angolanas com as recomendações das Nações Unidas e da OCDE sobre o tema.

No que diz respeito à coerência do sistema fiscal, solucionam-se alguns problemas que se vinham identificando com a publicação de diversos diplomas relacionados com a temática em causa que, não sendo contraditórios entre si, acabam por dificultar o processo de interpretação legislativa.

A existência de uma norma central no Código do Imposto Industrial, que é complementada por toda uma sistematização no Estatuto dos Grandes Contribuintes, mas que, posteriormente, e por exemplo no que respeita aos requisitos de documentação, acabou por ser alargada através de um diploma autónomo a agentes económicos que, não sendo grandes contribuintes, ultrapassavam um certo valor de proveitos, torna o sistema circular e pouco intuitivo. A sistematização de toda a legislação num só código vem facilitar a aplicação e cumprimento do mesmo pelos diferentes agentes económicos.

Outro exemplo é a actual consagração no Código de Aplicação de Capitais de juros presumidos a uma taxa pré-determinada, opção difícil de conciliar com as regras de preços de transferência potencialmente aplicáveis ao caso concreto.

No plano da consolidação das boas práticas fiscais, a reforma anunciada, que se espera que seja aplicável a partir de 2025, também se mostra relevante. O universo das regras especificas anti-abuso, com especial relevo na temática dos preços de transferência, foi sujeito a uma fase de adaptação gradual onde se exigiu aos operadores económicos de maior dimensão, com mais capacidade financeira e recursos técnicos, que implementassem os procedimentos necessários com vista a assegurar que as suas transações vinculadas respeitavam o princípio de plena concorrência minimizando, assim, o risco de elisão e evasão fiscal.

Passados vários anos sobre a implementação de um regime de regime de preços de transferência mais exigente, e havendo um imperativo de alargamento da base contributiva geral e de redução da informalidade da economia, Angola alinha com a maioria dos países no sentido de tornar este princípio aplicável, em todas as suas dimensões, aos agentes económicos que, não sendo necessariamente qualificados como Grandes Contribuintes, apresentam proveitos de valor significativo e operam em contextos onde as transacções vinculadas se revelam especialmente relevantes.

Dito de outra forma, as obrigações declarativas em sede de preços de transferência passarão a aplicar-se aos contribuintes que verificam determinados pressupostos previstos na lei podendo, no entanto, outros que não verificam tais pressupostos ser chamados a justificar as suas políticas, sendo-lhes dado obviamente o tempo necessário para prepararem os elementos solicitados pela Administração Geral Tributária (AGT).

A transição para um sistema unitário de tributação, em alternativa a um modelo cedular, também possibilita um melhor acolhimento, no ordenamento jurídico angolano, das normas constantes dos instrumentos internacionais que o país subscreveu, nomeadamente as convenções para evitar a dupla tributação.

Neste âmbito são especialmente relevantes as normas que visam eliminar os fenómenos de dupla tributação que se podem suscitar nas transacções envolvendo duas jurisdições contratantes e, em concreto, no respeitante aos preços de transferência, a aplicabilidade prática dos mecanismos de ajustamento correlativo, mais bem-adaptados a modelos de tributação unitários das empresas do que os cedulares, já muito pouco utilizados pelos diferentes países. Não se devendo esquecer, obviamente, a aplicação deste mecanismo no plano das transacções domésticas, como se encontra previsto no actual Código do Imposto Industrial.

No plano da segurança jurídica, o novo CIRPC contemplará, por certo, uma definição mais alinhada com as práticas internacionais no tocante aos métodos aplicáveis e das situações que configuram relações especiais, sendo a especificação adequada do escopo destas regras fundamental para que se enquadrem apenas no âmbito das regras de preços de transferência, quanto mais não seja pelo potencial aumento do escrutínio por parte da AGT, as situações em que existe um contexto efectivo de dependência jurídica ou económica susceptível de poder influenciar a aplicação do princípio de plena concorrência.

No mesmo plano, é de assinalar a intenção de implementar um modelo de Acordos Prévios de Preços de Transferência (APPT’s). Este modelo, que será sujeito a regulamentação autónoma, surge normalmente quando um determinado país já possui há um número de anos significativo um regime de preços de transferência consolidado do ponto de vista do seu enquadramento legislativo, doutrinário e jurisprudencial, acompanhado necessariamente pela existência de quadros experientes da AGT na aplicação e escrutínio do mesmo. Passada uma década sobre a publicação do atual regime de preços de transferência, uma parte significativa dos requisitos antes mencionados estará verificada.

Este é um modelo de acordo em que o contribuinte expõe à AGT uma determinada situação (e proposta de solução técnica) relacionada com a temática dos preços de transferência, como por exemplo: “qual o modelo de remuneração adequado quando uma empresa estrangeira atua em Angola através de um estabelecimento estável que realiza atividades de apoio à casa-mãe?”, “qual o valor a pagar pela utilização de activos intangíveis valiosos?” ou “qual a taxa de remuneração apropriada numa determinada operação que envolve a prestação de garantias entre entidades do mesmo grupo para obter financiamentos de terceiros?”. Depois de uma fase de negociação, o contribuinte e a AGT chegam a um acordo escrito sobre a solução para o problema, que vinculará a autoridade tributária, normalmente por um período de 3-4 anos.

Um modelo de APPT’s deve assentar num conjunto de princípios essenciais. Em primeiro lugar, a transparência, para evitar que determinados contribuintes possam beneficiar de condições fiscais mais favoráveis que lhes conferem uma vantagem competitiva significativa no mercado ou podem gerar perdas significativas para o erário público. Em segundo lugar, um modelo com o suficiente número de níveis de validação hierárquica que responsabilizem todos os intervenientes relativamente aos acordos celebrados que passam a vincular o Estado. Finalmente, a desburocratização, pois se o sistema de negociação for demasiado complexo e demorado, tenderá a afastar os contribuintes do processo, nomeadamente aqueles que não têm qualquer intenção de obter vantagens fiscais indevidas, mas apenas um quadro de actuação estável do ponto de vista fiscal numa matéria que, muitas vezes, apresenta dificuldades técnica significativas.

 

Artigo escrito por Paulo Mendonça EY Tax Partner, Head of Transfer Pricing

Resumo

Angola está a reformar o seu sistema fiscal, unificando vários códigos tributários num único Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRPC), para simplificar a tributação, alinhar com os padrões internacionais e melhorar a segurança jurídica. A reforma, prevista para 2025, visa também a expandir as regras dos preços de transferência e integrar convenções internacionais para evitar a dupla tributação.

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