No passado dia 20 de Janeiro de 2023, foi publicada, com efeitos retractivos a 1 de Janeiro de 2023, a Norma Regulamentar n.º 5/23, que aprova a entrada em vigor do novo Plano de Contas para as Empresas Seguradoras (PCES).
Todos os intervenientes do sector segurador em Angola estarão de acordo em como o novo PCES é uma resposta adequada, e no tempo certo, que a Agência Angolana de Supervisão e Regulação de Seguros (ARSEG) dá num momento que é de mudança, num sector que há muito carecia daquilo que hoje está a ser feito. No entanto, foi este o momento que o Regulador entendeu que o deveria fazer e como tal, é este o momento em que todo o mercado deve de acompanhar estas mudanças.
Com a publicação da Lei da Actividade Seguradora e Resseguradora (Lei n.º18/22) em Julho de 2022, o Regulador deu início ao processo de mudança profunda e disruptiva no sector segurador, nenhuma das normas que foram publicadas no início de 2023, até porque as mesmas estiveram em consulta pública, são novidade, e por isso, todo o mercado teve, e ainda tem, tempo e oportunidade para se ajustar a esta nova realidade, bastante desafiante, mas necessária.
No momento em que escrevo, decorreu um mês e meio desde o início do ano de 2023. Neste período foram publicadas cinco Normas Regulamentares pela ARSEG, destacando neste artigo a Norma Regulamentar n.º 5/23, a qual aprova o Plano de Contas aplicável às Empresas de Seguros (PCES).
A NR n. º5/23 vem substituir o Decreto Executivo n. º79-A/02, cujo Plano de Contas e os requisitos de relato financeiro se encontravam desactualizados, e não davam resposta às exigências da Lei nº 18/22, como por exemplo, no que respeita ao cálculo e apresentação contabilística das garantias financeiras.
Na nossa opinião, acreditamos que também existem duas mensagens que a ARSEG passa ao sector segurador com a publicação do novo PCES: i) figura-se como um plano de contas transitório, anterior à futura implementação das normas internacionais de relato financeiro (IAS/IFRS); ii) as alterações implementadas visam a padronização do relato financeiro das empresas do sector segurador angolano, incrementando as exigências regulatórias e a qualidade da informação obrigatória prestada aos utilizadores das demonstrações financeiras, aproximando o sector segurador das melhores práticas de relato financeiro.
Sendo a Norma Regulamentar n. º5/22 estruturante para o sector, existem inúmeras alterações relevantes e, não podendo abordar todas, gostaria de destacar as seguintes:
i) a nova apresentação da conta de ganhos e perdas, em que no passado existia uma página para os ganhos e outra para as perdas. Com o novo PCES a conta de ganhos e perdas é apresentada em conjunto, numa única página, o que facilita a leitura e vem alinhar a apresentação desta peça das demonstrações financeiras com as melhores praticas.
ii) a obrigatoriedade da apresentação da demonstração de fluxos de caixa (DFC) nas demonstrações financeiras auditadas. A DFC é um dos instrumentos mais robustos para compreender o verdadeiro estado ao nível de liquidez das Empresas. Com o novo PCES o Regulador, e outros utilizadores das demonstrações financeiras, terão oportunidade de analisar as Seguradoras pela sua robustez ao nível da liquidez, o que mudará o paradigma de como são analisadas as Empresas de Seguros em Angola, uma vez que que está peça, que pode não ser de fácil preenchimento, irá colocar de uma forma bastante evidente a realidade ao nível dos cashs flows das Seguradoras.
iii) uma evolução completamente disruptiva no que respeita às informações mínimas obrigatórias a apresentar como anexo ao balanço, e à conta de ganhos e perdas. No anterior plano de contas, eram exigidas muito poucas divulgações obrigatórias, no entanto, no novo PCES o Regulador exige trinta e uma divulgações obrigatórias, sendo que maioria se desdobram para que a informação prestada no anexo às demonstrações financeiras tenha a maior granularidade e informação possível. O número de divulgações aumentou consideravelmente, para a informação prestada fosse mais detalhada, mas também para que todas as seguradoras apresentassem um reporte financeiro uniforme, dai o Regulador ter introduzido um modelo obrigatório dentro da própria norma, o que irá sem dúvida beneficiar em primeiro lugar as Seguradoras e depois todos os utilizadores das demonstrações financeiras.
iv) com o objectivo de aumentar o rigor e a exigência no que respeita divulgação das transações entre partes relacionadas, foi criado o anexo I à NR n. º5/23. Neste anexo o Regulador já se aproxima bastante daquilo que são as normas internacionais, uma vez que o mesmo está completamente alinhado com as exigências da IAS 24 - Divulgação de Partes Relacionadas. Esta informação é bastante relevante, uma vez que as Seguradoras estão muitas vezes inseridas em grupos económicos ou são detidos por pessoas singulares que detêm outras participações noutras entidades, no entanto, com este anexo a ARSEG não deixa margem para dúvidas sobre tudo o que deve ser reportado sobre esta matéria.
Para terminar, não queria deixar passar a oportunidade de dar uma nota, que certamente é clara para todos, no entanto, nunca é demais reforçar, que com a entrada em vigor do novo PCES, as Seguradoras quando reportarem as suas demonstrações financeiras a 31 de Dezembro de 2023, terão para efeitos comparativos de apresentar um balanço e uma conta de ganhos e perdas com referência a 31 de Dezembro de 2022 (em formato novo PCES), um balanço de abertura a 1 de Janeiro de 2023, umas demonstrações financeiras que incluem um balanço e uma conta de ganhos e perdas com referência a 31 de Dezembro de 2023 com os comparativos com 31 de Dezembro de 2022 no formato do novo PCES.
É bastante claro que entrada em vigor da NR n.º 5/23 é um desafio para todo o sector, mas penso que todos os intervenientes estarão de acordo o novo PCES é uma resposta à altura dos tempos e dos desafios que vivemos no sector segurador.
Artigo escrito pelo Ricardo Vinagre, Director EY, Assurance Financial Services.